quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

BICA VOTNAMIS - O CAÇADOR DE ESTRELAS

Este post foi feito em junho de 2010. Como tem muita gente novata aqui no Blog, resolvi reeditá-lo por tratar-se de uma história incrível, a de Bica Votnamis e seu Caçador de Estrelas. 
Bica Votnamis nasceu na Romênia e veio para o Brasil na década de 40 acompanhando a família que havia fugido da Europa do pós guerra e foi para São Paulo quando o seu pai montou uma oficina mecânica e ele começou a tomar gosto pela coisa, ajudando no que podia. Em 1964, colocou o primeiro carro para correr, um Renault Gordini 1093, depois, um Simca Chambord, Carretera Corvete V8 e outras participações.

Nas mil milhas de 1967, Bica inscreveu o incrível Caçador de Estrelas, um protótipo construído com motor Corvette central V8 e com a cabine do piloto que ficava à frente do eixo dianteiro e chegou até a andar na pista, mas o carro não foi homologado e ele foi retirado da lista de inscritos.

Abaixo, relato do Guilherme Decanini, falando sobre Bica Votnamis e seu Caçador de Estrelas.

Um pouco da história: meu pai foi mecânico de automóveis a vida toda, e tinha como cliente o pai do Bica. O Bica já tinha uns 25 anos, rico de montão e começou a correr. Primeiro de Renault 1093, depois Simca, e daí partiu para disputar várias competições com Carreteras. Comprou algumas coisas do pessoal do Sul, e assim estamos quase chegando perto no Caçador de Estrelas.

Naquela ocasião, eu já tinha uns 12/13 anos e vivia enfiado na graxa, ajudando meu pai e pentelhando o Bica (que utilizava a oficina do meu pai como base para preparar os carros) para andar de Carretera.


Lembro-me bem de que ele, na maioria das vezes, andava com o numeral 34, e me levava para testar algumas modificações do carro, neste tempo um Chevrolet comprado do Catarino Andreatta (uma fera), pelas ruas da Barra Funda. Eu "viajava" sentado no tanque, segurando a bateria com uma mão e tentando me ajeitar naquela porra que mal tinha santantonio. Um tesão desgraçado.

Foi então que Bica resolveu montar sua própria oficina de preparação, na Rua Barra do Tibagi, no Bom Retiro. Aqui começa a história do Caçador de Estrelas. Foi nesta oficina que nasceu o bicho. O Bica viajou para os Estados Unidos e trouxe um motor de Corvette, já preparado com 8 maravilhosas cornetas que tinham pelo menos 30 centímetros de altura, projetando-se para cima do coletor. Trouxe também uma série de componentes de suspensão, freios, diferencial autoblocante, rodas para cubo rápido, etc.

O Caçador de Estrelas acelerando nos treinos dasMil Milhas de 1967.
Então, contratou dois mecânicos da oficina do meu pai e começou a montar o carro. Partiu do zero com pretensões iniciais de construir um esporte-protótipo de dois lugares, motor dianteiro, com chassis tubular e carroceria de alumínio.

Contratou soldadores e partiu para a montagem. Tudo andava bem até o momento em que o Bica decidiu mudar o projeto. Ao invés de um carro com motor dianteiro, resolveu fazê-lo com motor central. Mede daqui, mede dali, e ficou decidido que o cockpit iria ser montado no eixo das rodas dianteiras.

Puta loucura, o Bica comprou uma Kombi para se acostumar a pilotar com naquela posição fantástica, e acredite, a caixa de direção do carro era de fato, uma caixa de Kombi, com a barra cortada e montada verticalmente no cockpit, e as pedaleiras obviamente separadas pela coluna – ou seja, acelerador e freio ao lado direito da coluna e a embreagem do lado esquerdo.

Cabine à frente do eixo dianteiro e caixa de direção da Kombi
 
Quanto à carenagem, outra estória das boas. O Bica era muito amigo de um outro piloto, de nome Roberto Gomes, argentino boa pinta, que corria de Simca, e era cheio das amantes que eu, garotão, só ficava cobiçando. Amenidades à parte, o Roberto Gomes trouxe para o Brasil um conterrâneo de nome Paulo, mestre na arte de modelagem de alumínio, que esculpiu a carenagem do Caçador de Estrelas, sob as orientações nada ortodoxas do Bica.
Assim nascia o Caçador de Estrelas, Star Fighter, que não se tratava de um nome advindo da NASA, como foi dito na reportagem que li recentemente, mas sim de um avião caça da Força Aérea de Israel.


Repare a cabine ficava à frente do eixo dianteiro
Visão da traseira (coisa de doido)
Motor de Corvette, câmbio de Jaguar, diferencial autoblocante, rodas de cubo rápido, freios a disco nas 4 rodas, carenagem do Paulo argentino, parabrisas e proteção dos 4 faróis bi-iodo com acrílico do Edson Ferri. Um provável foguete?

Ao término da montagem foi realizada uma reportagem de folha inteira pelo Jornal da Tarde – alias, consta o nome do jornal na carenagem do Caçador de Estrelas. No dia da reportagem lá estava eu, pentelho e xereta, constando como colaborador da construção do carro,que pude acompanhar todos os dias, após sair do colégio próximo à Oficina do Bica.

 

 
Aqui o motorzão Corvete V8 no centro do carro
Após os primeiros treinos, o carro não foi homologado por motivos óbvios de segurança. O Bica ficou puto. Decepção Geral!! Choradeira!! Então, ele comprou naquela semana das Mil Milhas de 1967 (acho que foi por aí), uma outra carretera, tirou o motor do Caçador e foi para a prova, cujo resultado minhas lembranças não registram. Depois daquele fatídico dia, o Caçador foi desmontado e o que sobrou virou sucata.
 
Rodas de Corvete raiadas
Começou então uma nova sina. Com a mesma equipe, agora na Rua Jaraguá, também no Bom Retiro, sobre um chassis de um Oldsmobile Ninety Eight, de um tio do Bica, pois loucura pouca é bobagem, começava a nascer um novo protótipo também esculpido pelo Paulo, agora com motor central.

O carro estava lindo e quase pronto, quando em 1967 eclodiu a Guerras dos Seis Dias, na qual Israel estava envolvida até os dentes. O Bica viajou para Israel, segundo ele mesmo para defender a sua Pátria. Ficou de voltar. Nunca mais voltou, deixando a oficina montada, mecânicos sem saber o que fazer, e os xeretas de plantão, perplexos com um carro inacabado que o destino se incumbiu de fazer desaparecer no tempo.
Nunca mais soube nada a respeito do Bica, até me deparar com a reportagem já mencionada. Diz a reportagem que o Bica deve estar no andar de cima. Não sei, não posso afirmar, mas acho que pela nossa diferença de idade, pois hoje já estou com quase 50, já dariam ao Bica uns 70/75 anos, no mínimo.
Se ele já foi, por certo deve estar entre amigos, acelerando forte aquele bicho feio. Nós aqui, com saudades de um tempo muito louco.
Só para se ter uma idéia, durante a construção do último carro, o Bica tinha um Chevrolet Impala. Pois o maluco pegou o motor do Corvette, bravíssimo, e montou no Impala (o Paulo recortou o capô do Impala zero para as oito cornetas) só para visitar os amigos que tinha no Rio Grande do Sul. Imagine o quanto andava aquela merda!!!!”
Fotos reprodução, fonte: relato Decanani no gptotal

12 comentários:

  1. Adoro gente maluca, e o "Caçador de Estrelas" sempre foi um carro que frequentou meus mais malucos sonhos.
    Eu realmente cada vez admiro mais o automobilismo antigo, com pilotos que eram projetistas /mecanicos/preparadores/engenheiros/etc/etc, e que criavam estas coisas que hoje, com um monte de inveja, chamamos de absurdas.

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  2. É Mario, são os verdadeiros sonhadores que enfiavam a mão na massa e partiam para a realização dos projetos mais estranhos que a imaginação pudesse criar. Lembro-me dos mil quilômetros de brasilia quando era realizados nas ruas da cidade, todo ano, quando chegava o mês de abril, já ficava tentando imaginar o que apareceria de novidades.
    Jovino

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  3. Parabens pelo relato Guilherme !!!
    Muito legal cara.

    Fabio Farias

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  4. Lembro do Cassador de Estrelas, mas com outra carroceria, nos 1000 KM de Bsb em 1968, batendo no paredão da rodoviária.
    Era um foguete!!!!

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  5. mario parussolo filho5 de julho de 2010 às 21:48

    É nasci em Interlagos nos anos 50, me lembro bem do caçador, como mto outros carros estranhos, mais isso era a essencia do automobilismo, carreteiras, DKWs, gordinis, berlinetas, macacão, era calça de brim mesmo, capacete de couro cru, luvas? hum que é isso, e sabe qto mtos desses carros chegavam no final do retão, 250,280,300 por hora, é eé isso mesmo, principalmente as carreteiras, grandes lembranças, abraços a todos. Mario Parussolo Filho

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  6. Mário, legal o seu relato. Apareça sempre.
    Jovino

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  7. mario parussolo filho27 de julho de 2010 às 20:32

    è como disse, nasci nos anos cincoenta, e sabem a onde? não? então vou dizer, na curva um de Interlagos (circuito antigo)vi realmente mta coisa acontecer, as primeiras voltas da BMW sem teto, sem teto sem coluna sem nada, Jean Balder, Meta 20 de Chico Landi, em um treino ele errou a curva um e desceu laaa pra curva do sol, barranco abaixo sem se machucar, uma curiosidade, anos 70 começo, Sid ( mosca) corria de Fusca, deu uma capotada na curva dois, ajudamos a socorre-lo, e ele disse que nunca mais andaria de carro de corrida, graças a Deus, veja so o que ele virou, Camilo Cristofaro qdo comprou as rodas da Ferrari que veio correr aqui na Copa 70, era pelo menos 3 ( tres) vezes mais largas que as rodas que ele corria, na curva do sol ele passando pela Alfa Furia de Jaime Silva, deu-lhe uma trolhetada de lateral, e nofinal da prova ele disse " caramba esqueci o qto essas rodas trazeiras são maiores que as antigas, que paulada em salame", bem chega depois mando mais alguma coisa, abraços a todos

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  8. Eu conheci Bicas em 1965 numa das corridas de estreantes na qual meu pai Alberto Pellicciotti corria com Gordon 1093, Bica anda com carreteiro meu pai por e fluência do Bicas comprou Já que link número 3 tempo bom que não volta mais eu tinha 15 anos conheci Amaral Neto, Camilo, Piero Garcia etc...

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  9. O Blog esboça aspectos muito interessantes do famoso Bica Votnamis, uma das mais controvertidas e originais figuras dos tempos primitivos e heroicos do automobilismo de competição do Brasil, mas erra ao afirmar que Bica após uma viagem a Israel em 1967, quando da eclosão da Guerra dos 6 Dias, nunca mais voltou e não se soube mais dele. Dois anos mais tarde ele surgiu numa competição em Curitiba e, ao volante de um Corvette, roubou a cena da prova, protagonizando uma trapalhada inesquecível: A largada era do tipo Indinapólis e de repente o Bica, ainda durante a volta de apresentação, ultrapassou os carros à sua frente e ganhou a dianteira, os outros vendo isso aceleraram fundo e o pega começou. A Direção da Prova anulou a largada e os carros, que já vinham num ritmo forte, tiveram de frenar. Foi uma loucura, um policial saltou na hora H e quase foi atropelado e depois de muito bate boca, desclassifica ou não desclassifica, resolveram punir o Bica em três voltas de atraso. Ele, mesmo assim, ainda conseguiu chegar em terceiro ou quarto lugar. Não fosse isso, certamente teria vencido a corrida. Bica gravou seu nome na História do automobilismo, tanto pela sua excentricidade, quanto pela sua marca registrada: Aparecia sempre com "aqueles carrões"!

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  10. E mantem-se a sina, o Caçador de Estrelas teve o mesmo fim ingrato (desonroso?) do Carcará: lixo!

    Infelizmente é exceção os sobreviventes, como o Copersucar (o original), o Maverick Berta/Hollywood, o Escort/Dimep V8 (pelo menos a alguns anos tinha alguém ressuscitando-o)... onde andará o Fusca Hot-Rod do Arnaldo Fossá, que dava canseira nos Opalas e V8s debaixo de chuva na antiga Divisão 3?

    Feito!

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  11. E mantem-se a sina, o Caçador de Estrelas teve o mesmo fim ingrato (desonroso?) do Carcará: lixo!

    Infelizmente é exceção os sobreviventes, como o Copersucar (o original), o Maverick Berta/Hollywood, o Escort/Dimep V8 (pelo menos a alguns anos tinha alguém ressuscitando-o)... onde andará o Fusca Hot-Rod do Arnaldo Fossá, que dava canseira nos Opalas e V8s debaixo de chuva na antiga Divisão 3?

    Feito!

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  12. Li em algum lugar que Bica Votnamis havia se mudado para Porto Alegre, onde montou uma oficina, e que faleceu por lá. Assisti a corrida em Curitiba e o prototipo dele era realmente minimalista. Só tinha o essencial, com o radiador aparecendo na frente. Existe uma filmagem de uma corrida de estrada no Rio Grande, vencida por um dos Mark II da Willys, dirigido por Luis Pereira Bueno ou Bird Clemente. No carro de Breno Fornari, um reporter gravou a corrida de dentro do carro e mostra a ultrapassagem de Breno com o Prototipo Regente, sobre Bica Votnamis que dirigia um Corvette dos primeiros anos.

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