segunda-feira, 14 de junho de 2010

WALDIR LOMAZZI - RESGATANDO A HISTÓRIA DO ELGAR GT 104

Semana passada, atendendo a diversas sugestões de ex-pilotos e amigos, estive na residência do Waldir Lomazzi e batemos um longo papo a respeito da construção do Elgar GT 104, protótipo que fez muito sucesso nas pistas brasileiras no final das décadas de 60 e início de 70.

Idealizado pelo Ênio Garcia e executado por Waldir Lomazzi, esta entrevista é um resgate da história deste carro que ainda não foi contada por aquele que enfiou a mão na massa e durante um ano, trabalhou na construção de duas unidades, inspirado numa Ferrari Dino em escala bem pequena (possivelmente 1/43) apresentada pelo Ênio Garcia e também, uma homenagem que fazemos para aquele que ficou um pouco esquecido nesta história. A maioria das fotos são inéditas guardadas por mais de 40 anos.

Lomazzi em sua residência quando nos recebeu

MOCAMBO BLOG – Waldir Lomazzi, como começou a ideia de se construir o Elgar GT 104?

WALDIR LOMAZZI – Começou quando o Ênio me procurou e me levou a seu apartamento em que ele morava na 305 sul e falou: “O carro é este”, e me mostrou uma miniatura da Ferrari Dino, (possivelmente escala 1/43 pelo tamanho que ele simulou) pois aquele carro nada mais era do que uma Ferrari Dino.

Depois, eu olhei a parte de baixo abrindo, ela abria de frente para trás e me mostrou o motor e me falou que teríamos um patrocínio do Osório Adriano da Brasal, mas já arrumado tudo para a gente fazer o carro lá na Stil, que era uma empresa de perfis de aço e eu falei-lhe, tudo bem.

Foi aquela engenharia meio primária, por exemplo, a distância entre-eixos original era de 2,80 metros, muito longa para um carro de competição pois como se sabe o entre-eixos em competição é fundamental. Quanto mais curta e até certo limite facilita a condução em curvas de raio curto; mais longa melhora o desempenho em retas e curvas de alta.

Então, o Ênio estabeleceu um meio termo em 2m28. Aí, pegamos a suspensão do fusca de corrida do Ênio (o famoso Cascão-Brasal) e colocamos no chão. Instalamos o câmbio com o motor entre-eixos e aí começamos a fazer os perfis de aço e começou todo o trabalho. A gente trabalhava toda noite, todo sábado, todo domingo, todo feriado, a mulher estava até querendo me largar (risos) e levou um ano para sair os dois carros, depois de muito trabalho, pois quando se fazia uma peça já a fazia duplicada, pois seria para os dois carros (um foi para a dupla Toninho Martins/Ênio Garcia e o outro para a dupla Waldir Lomazzi/Paulo Guaraciaba.

O carro começando a pegar forma

Detalhe do chassi feito de perfis de aço (bem rústico e que funcionava)

MOCAMBO BLOG - O chassi, como foi feito? Você falou que usou perfis de aço, e hoje muitos carros especiais são construídos com o chassi com estrutura tubular. Como foi construir com perfiz de aço?

Aqui a estrutura toda de arame quase pronta

WALDIR LOMAZZI – É, as medidas foram sendo tomadas. Lá era perfil mesmo, na base do quadrado. Então, se media a longarina e pedia-se para fazer a dobra e fazia-se as duas peças. Depois do chassi pronto, fazia-se o acoplamento no quadrado da suspensão Volkswagen, a suspensão dianteira dele era de barra de torção, mas nós usáva-mos uma barra só, sem ação, só para segurar a suspensão e só tinha uma barra que funcionava, pois o carro era muito leve.

Visão da traseira já montado o câmbio

MOCAMBO BLOG – E o projeto, como foi estabelecido? Como começou a ideia do projeto?

WALDIR LOMAZZI – O Ênio apareceu com ele no papel, ele pegou uma miniatura bem pequena da Ferrari Dino, como dito anteriormente, e colocou ela em escala, ele fez o desenho e a media fazendo em escala e falou: “isto em escala vai dar tanto”, pegava-se a medida e a calculava, “isto aqui vai dar tanto, em centímetros” e assim foi-se construindo o carro.

Motor entre-eixos


MOCAMBO BLOG – E a suspensão traseira?

WALDIR LOMAZZI – A suspensão traseira foi em mola espiral mesmo, as articulações, os tambores de freios, tudo original Volkswagen, já que a mola traseira, eu peguei e fiz uns braços para pegar na capa do semi-eixo. O que deu muito trabalho também, foi a articulação de câmbio, pois o câmbio ficou virado para trás, então para fazer aquela peça, deu muito trabalho.

O próprio Waldir Lomazzi testando a posição do banco e pedais


MOCAMBO BLOG – Como ficou a posição da alavanca de câmbio, a primeira, ficou na posição da primeira mesmo, ou não?

WALDIR LOMAZZI – Não. Ela ficou invertida, o diferencial virado ao contrário né, porque você tinha que fazer o seguinte: você tinha que pegar a coroa e virar pro outro lado dentro do câmbio, pois senão, ficava a ré andando para a frente e aí ficaria tudo errado. Este problema de câmbio invertido aconteceu com o Chapéu de Freira lá em Fortaleza (fusca feito pelo Von Negri).

Tivemos que tirar a caixa 3 e no treino, o carro ficou sem a segunda, o carro foi para a oficina à noite e no montar da caixa, eles colocaram a coroa do lado direito, como se tivesse o motor entre-eixos e quando fechou-se a caixa, já era 3 horas da madrugada e eu falei para o Von Negri: vamos dar uma volta no carro, e ele respondeu: “não, vamos embora para casa”.

No dia seguinte, fomos para o autódromo de taxi e o Von Negri foi para a oficina pegar o carro. Foram o Raimundo, o Carlão e o Japonês. Aí o Alemão funcionou o carro e quando foi sair e engatou a ré, o carro foi para a frente, na 1ª, segunda e terceira, o carro ía para trás, e aí, como é que se faz, tiramos o câmbio e eu fui tentar retardar a largada o mais que pudesse e quando chamaram para alinhar, o carro tinha chegado no grid.

Com a estrutura de arames com o gesso já moldado


MOCAMBO BLOG – Lomazzi, e os patrocinadores foi só a Brasal, ou teve outro?

WALDIR LOMAZZI – Teve a Brasal e para terminar o carro, o Castaldelli, que era uma fábrica de geladeiras e a Stil, que fazia perfis de aço. Eu levei o carro para o Gama todo já montado no arame (como mostram as fotos) andando e abria-se o capô, portas, o que dava acesso ao motor, tudo abrindo em arame.
O Castaldelli tinha um senhor, o Manoel, que era um verdadeiro artista, então ele colocou em cima de toda a estrutura do carro em arame sacos de gesso e assim foi fazendo, esculpindo o molde com gesso e daí, as peças, os para-lamas, o capô, enfim, toda as partes do carro. O para-brisa dele foi da Berlineta Interlagos, e aí eu cheguei nos lanterneiros da Brasal e falei para eles fazerem o modelo de arame para ficar igualzinho ao para-brisa da Berlineta, mas eles não deram conta e acabou que eu mesmo fiz o modelo. Outra peça que eu fiz foi o berço do farol, apesar de eu não ser lanterneiro.

Aqui, a carroceria já praticamente pronta


MOCAMBO BLOG – Este projeto de vocês, com motor central, foi um projeto inovador para a época?

WALDIR LOMAZZI – Na época fazia-se muito protótipos na plataforma Volkswagen e este foi um chassi próprio, com chapas perfiladas, com motor entre-eixos , o próprio Patinho Feio, era plataforma, com motor pendurado. A carroceria do Elgar foi feita em arame e os pneus, câmbio, tudo Volkswagen.


Sr Manoel, um verdadeiro artesão

MOCAMBO BLOG – Quais eram as polegadas que vocês usavam nas rodas do Elgar?

WALDIRLOMAZZI - O aro era 13 e era feito de chapa mesmo, as talas de 7 polegadas e as rodas "bolo de noivo" foram usadas depois com outros pilotos.

MOCAMBO BLOG – E os pilotos que andaram com ele?

WALDIR LOMAZZI – O Ênio, eu, o Toninho Martins, o Penta, o Zeca Zupa, Luis Claudio Nasser, o Barata e o Carlito Santo Mônica. No Pelezão, correram também o Gladstone e o Haroldo Meira, isto, quando o carro já era do Penta.

Ricardo Penta testando a posição do banco

MOCAMBO BLOG – E a estreia do Elgar, quando foi?

WALDIR LOMAZZI – Os carros estrearam nos Mil quilômetros de Brasilia de 1969 e eu estava conduzindo um deles, apesar de estar andando muito bem e já estar chegando nas primeiras posições, ele teve entupimento do tanque de gasolina por causa dos respingos de soldas que caíram dentro dele quando ele foi construído e não houve tempo para solucionar estes pequenos detalhes até a prova, isto tudo, na primeira volta, e o carro pifou e não terminou a corrida.

O Elgar antes da largada

MOCAMBO BLOG – Lomazzi, para terminar, e as vitórias do Elgar?

WALDIR LOMAZZI – Que eu me lembre, só os 500 km de Brasilia de 69 com o Toninho Martins e o Luis Claudio Nasser.

Recebendo a bandeirada 500 km Brasilia de 1969

Luis CLaudio Nasser e Toninho Martins após a vitória nos 500 km de Brasilia de 1969


Fotos arquivo pessoal do Waldir Lomazzi

19 comentários:

  1. Muito bom tomar conhecimento da cochia na construção do ELGAR e rever o meu amigo percador e músico Waldir.

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  2. Tenho ainda muitas fotos que não deram para colocar no post e futuramente, vou colocando aos poucos para mostrar todo o passo a passo da construção do Elgar.
    Jovino

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  3. Jovino, coloque mesmo estas fotos pois elas me ajudarão a terminar uma ilustra que comecei do Elgar mas me foi impossível terminar devido à falta de qualidade das fotos disponíveis.

    Coloquei fotos de minha viagem à bsb lá no meu blog. Depois vá lá, ok?

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  4. Mauricio, vou ver se consigo fotos mais nítidas com o Ênio Garcia hoje. As que eu tenho que o Lomazzi me disponibilizou, umas 60, estãono mesmo esquema destas e não vão ajudar muito para você.
    Jovino

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  5. Fantástico, Sensacional!!!!!
    Como tenho comentado, admiro a "engenharia" antiga, e pior de tudo, funcionava!!!!!
    Parabens Enio e Waldir Lomazzi pela obra, e a voce Jovino pelo resgate.
    Breve teremos também a história do "Elgar-Vê 102/66".

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  6. Muito Bom ! e muito bonito !pena não ter sobrado nenhum ...ou sobrou ?

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  7. Dinho, existe umas lendas, mas estamos investigando. Independentemente disto, estou batalhando com um pessoal aqui para construir ele novamente.
    Jovino

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  8. Mário, é muito bacana um cara jovem como você e que reconhece e dá valor nestes meninos que fizeram a histórias do nosso automobilismo.
    Eu também fico fascinado por esta época que vivi quando era menino.
    Agradecimento muito especial ao meu amigo Joaquim Lopes Filho, o Mestre Joca, que está sempre me dando apoio quando preciso.
    Agora, como faço todas as quintas, vou me encontrar com estes meninos que estão lá no Bar da Lapa tomando umas e jogando conversas fora sobre o assunto preferido, e vocês advinham qual é, né.
    Jovino

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  9. Muito bacana este resgate desse belo carro.

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  10. Jovino,
    É um grande registro para a história do automobilismo do DF essa matéria com Waldir Lomazzi postada aquí.
    Creio que Von Negry, Inácio Correa Leite, Paulo César Lopes, Dirceu Bernardon e tantos outros, têm muito ainda a contar sobre corridas em Brasília.
    Parabéns !!!!!!

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  11. Hamilton, a minha maior dificuldade é justamente de colher algum material com este pessoal (fotos, histórias,etc)para serem colocados aqui no Mocambo, apesar de tentar muitas vezes e o Penta estar me ajudando, só consegui com o Lomazzi depois de muito trabalho, não vi interesse dos próprios envolvidos na história do automobilismo brasiliense e assim fica difícil fazer algo melhor.
    Jovino

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  12. Jovino,
    O Lomazzi, agora, só quer saber de música e bandolins......
    É uma grande pessoa.
    Abs.

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  13. Qual Hamilton é você? O firmo eu sei que é o Guerra.
    Abração !
    Carlos Pontual

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  14. Parabéns pela reportagem e por resgatarem a história do automobilismo.Sou fã do Lomazzi por ser esse homem incrível e cheio de lições de vida.Waldir agora só curte os bisnetos,
    pai te amo a cada dia!

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  15. Este comentário foi removido pelo autor.

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  16. grande resgate do piloto incrivel e profissional e maior pai do mundo, vendo esta materia me emocionei,me recordo da construçao da jiripoca outro grande feito do Waldir. ela foi o grande destaque nas corridas do pelezao, teve uma inesquecivel o maior duelo que presencie deste grande piloto contra o paulo cesar pes no volks da brasal,grande paulo cesar, na segunda feira estava estampado na pagina de esporte do correio brasiliense SÃO WALDIR, ele só faltou fazer chover. Waldir, tentei seguir mas, não consegui até no futebol vc foi grande. beijos te amo muito....waldir lomazzi junior... guarai to

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  17. Dione e Junior,
    Só agora vi os seus comentários.
    Este é um resgate que o Mocambo blog está fazendo daqueles que fizeram a história do automobilismo brasiliense e o Lomazzi é um deles.
    A poucas semanas hemenageei o Neidiel Roure que foi um dos grandes pilotos brasilienses e novas matérias virão.
    Jovino

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    1. jovino !cobre do lomazzi fotos da JURUPOCA! foi outro carro de corridas que ele e o BERNARDO português fizeram,tinha mecânica de corcel,e tinha uma história que as rodas traseiras curvavam um pouco em curvas! esse carrinho foi construído na época do pelezão.

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